domingo, 5 de agosto de 2018

O envolvimento dos moradores do Pasmadinho na pintura de suas casas

Quando cheguei à comunidade do Pasmadinho, acompanhado por amigos contactados previamente em Itinga, e tendo explicado para algumas pessoas do povoado a proposta artística, tal investida foi vista com grande estranheza! Surgiu um clima de desconfiança e incompreensão, cuja desconstrução ainda está em curso. Na verdade, em outras experiências comunitárias, eu já havia percebido que a maioria das pessoas têm imensa dificuldade em crer que algo possa ser oferecido de forma absolutamente gratuita. A natureza humana está afetada pela constatação de que tudo neste mundo tem seu preço, e se algo não o tem, é porque sua intenção ou qualidade é no mínimo dúbia! Tenta-se, neste contexto, encontrar as "cláusulas" obscurecidas, e cuja consequência surge em algum momento. Bem, eu não tive outro discurso senão o de que, executar tal projeto visa tão somente levar arte e cultura a esses rincões muitas vezes esquecidos ou desprezados pelas administrações públicas e políticas, retórica que não convenceu muito. Só após algumas semanas, e tendo as pessoas observado que meu expediente sacrificante não poderia ter outra razão que não uma simples vontade, é que uma credibilidade mais afável tem surgido.
Se os adultos seguem com suas fantasias e precauções, as crianças se jogaram com todo o ardor infantil na proposta! Têm sido elas, seguidas eventualmente por alguns jovens ou adultos, minhas maiores colaboradoras e admiradoras. Para elas ainda não existe este universo de permutas e interesses, e por isso elas têm fruído o projeto em sua essência mais autêntica e pura. Ao chegar no povoado todas as manhãs, elas surgem de todos os lados, dispostas a colaborar da forma que possível.Seja auxiliando-me no transporte de material, preparo das tintas e na concepção das pinturas, estão sempre ao meu redor, com suas brincadeiras, dúvidas, demandas e ternura. Eu acerto com cada morador qual motivo iremos pintar em sua parede, levando em conta as condições da mesma, já que o material ou acabamento da casa interfere fundamentalmente no trabalho a ser executado, e após esboçar no suporte a estampa, distribuo material e orientações para que as crianças pintem livremente. Depois faço as devidas correções e acabamentos. As crianças então se orgulham em mostrar umas às outras o que pintaram, numa interessante sensação de pertença e capacidade.
Na medida que as pinturas foram se espalhando pela vila, os moradores começaram ter uma visão mais clara de sua dimensão, e consequentemente começaram a solicitar projetos mais complexos e conceituais para suas casas. Ou seja, a disseminação dos trabalhos tem tornado mais amplas e livres as ideias das pessoas, bem como seu modo de ver o mundo ou seu próprio habitat, e isso por si sintetiza o melhor de minha pretensão. Seguirei fazendo aqui eventuais atualizações acerca deste trabalho...

Segue uma linda galeria de imagens das crianças do Pasmadinho no auxílio da tarefa












6 comentários:

  1. Parabéns, um pouco de alegria a um povo tão sofrido lugar onde fui criado e pretendo voltar, obrigado!!!

    ResponderExcluir
  2. Alegria grande do dia foi conhecer este lindo trabalho!!! Não me canso de admirar! Parabéns!
    Espero poder conhecer de perto em breve!

    ResponderExcluir
  3. Olá Wederson, sou Luiz Carlos Fadel. Fiquei encantado (literalmente) com seu trabalho em Pasmadinho. Sou professor e pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Faço parte do Departamento de Direitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural. Antes de ser professor fui pediatra e, além das pinturas, encantou-me também o seu carinho com as crianças e a forma de tratá-las como seres pensantes e criadores. Coordeno um blog de saúde do trabalhador e nele temos uma seção de arte em nosso boletim. No mês de julho vou divulgar seu trabalho em nosso Boletim mensal. Nosso trabalho também não tem patrocínio e é direcionado para alunos, trabalhadores, sindicalistas e representantes de movimentos sociais. Creio que eles devam conhecer o seu trabalho. Pessoas como você fazem bem ao Brasil, principalmente nos dias de hoje, ungidos pelo deus-Mercado. Muito obrigado e Parabéns, Fadel.

    ResponderExcluir