sexta-feira, 29 de julho de 2016

"...A mesma praça..." mas o banco não é o mesmo.

A arte simples, num simples banco de praça

   Incomoda-me sempre ver, pela cidade, pracinhas arruinadas! Esses fundamentais espaços que, na sufocante realidade urbana, permite-nos respirar. Em minha infância tive muitas ruas para brincar, mas o que as crianças tem hoje? Por isso fiz, numa pequena pracinha, uma
singela pintura num dos seus bancos, com figuras que remetem ao que, a priori, deveria ter ali. Sei que logo a própria pintura estará igualmente deteriorada, mas talvez o recado tenha sido dado...







Pintura sobre concreto, por wederson



quinta-feira, 28 de julho de 2016

Carta O LOUCO

   Ao trabalhar alguns anos com saúde mental em Minas Gerais, adquiri uma nova visão quanto a questão da loucura. Dei-me conta de que ela é algo muito mais triste do que aparenta, complexa em suas inúmeras formas de entendimento, mas também aprendi o quanto este indivíduo dito louco é instigante, fascinante e singular. Como artista, tal experiência serviu para alimentar meus instintos com um procedimento mais despojado e desagarrado de conceitualismos dados como certos ou ideais.
   A carta do tarot O LOUCO é talvez a que melhor se aplica a minha própria condição. Sinaliza uma certa inquietação, a curiosidade, o permitir-se novas experiências, a busca pelo novo, a realização de desejos em geral reprimidos ou mudanças necessárias_ o que, certamente, pode causar-nos uma incômoda confusão_ mas orienta atitudes espontâneas e acolhedoras, levando-nos a saber que, na caminhada, apesar de todo cabedal intelectivo acumulado, somos sempre aprendizes.
    Em minha concepção artística, elaborei uma pintura bem equivalente à representação usual da carta, uma vez que tal imagem deixa bem claro  esta conduta peripatética.

   Pintura O LOUCO_ acrílico sobre tela_ 120x200 cm, por Wederson
                    
    

terça-feira, 26 de julho de 2016

Uma casa, um mangue...

   Em 2015 fiz esta pintura mural em uma casa no Espírito Santo. Ela fica  numa praia quase selvagem, às margens do formoso encontro do rio Cricaré com o mar. O rio, que vem serpenteando do interior do estado, tem como vegetação ciliar o mangue, ali muito bem preservado, onde se encontra com fartura o apreciado caranguejo Aratu, cujas cores vermelho-alaranjada deixa florido o chão de lama preta do ecossistema. 
   Em determinadas épocas, os caranguejos saem das tocas, no que se denomina "andada", para se acasalarem. É comum encontrá-los inclusive nas estradas próximas ao mangue, onde tornam-se vítimas muito vulneráveis, tanto de catadores sem consciência( já que em tal período a cata é expressamente proibida), bem como de veículos que os acabam esmagando. A destruição dos mangues ou a coleta indiscriminada dos caranguejos coloca-os em avançada e perigosa ameaça, sendo que a cata de algumas espécies hoje raras já está proibida.
   A foto que abre a primeira postagem deste blog refere-se ao trabalho que fiz nesta casa. Hoje, resolvi contar a história por traz da imagem, e porque o notório personagem, nesse contexto, mereceu tal homenagem...



      CARANGUEJO ARATU- Pintura em acrílico sobre parede, por Wederson

domingo, 24 de julho de 2016

Carta A CRIANÇA

   A CRIANÇA é uma carta do baralho cigano. Como tenho dito, existem vários modelos de baralho, cada qual com suas cartas e conotações específicas. Indica, em geral, a inocência, as descobertas, e as atitudes pueris tão equivalentes à infância. Aponta novos caminhos, e aquela ação tão despojada de uma certa falta de limites, que faz com que a criança se julgue capaz de qualquer coisa. Traz-nos uma mensagem de leveza, por isso em minha representação pictórica vai uma menina equilibrista, no amparo da mãe, mas com uma convicção e determinação impassíveis.


Pintura- A CRIANÇA- acrílico sobre tela, 
120x200cm
por Wederson

quarta-feira, 20 de julho de 2016

São Jorge

  São Jorge, soldado romano nascido na Turquia, degolado no ano de 303 por declarar-se cristão, tornou-se, a despeito de uma biografia lendária, um dos santos mais cultuados no mundo. Na umbanda, está associado a Oxóssi e Ogum. No tarot, é relacionado à carta "cavaleiro de espadas". Sua imagem, montado num portentoso cavalo matando um dragão, provém de mais uma das lendas que cercam a vida do santo, mas pode também ser vista como uma metáfora de sua "luta" contra satanás.
   Pintei este quadro repleto dos elementos geométricos dos baralhos, mesclando-os à já tão mítica representação figurativa do santo, conferindo-lhe nas cores chapadas um mosaico de formas e tons.


Obra -VALETE- acrílico sobre tela
120x120 cm

terça-feira, 19 de julho de 2016

Ilustração na beira do córrego Cheflera

   Na região norte de BH nasce o córrego Cheflera. O nome estranho deve-se a uma planta asiática muito utilizada em jardinagem:


   O regato é afluente do córrego Vilarinho, que deságua no ribeirão do onça, e que por sua vez encontra o Rio das Velhas. Todos eles terrivelmente poluídos na grande BH. O pobre córrego Cheflera, no bairro Etelvina Carneiro,  e personagem desta publicação, até matem em alguns redutos uma certa beleza, triste e mórbida, mas como muitos outros em nossa cidade, está iminentemente condenado.


Fotos do córrego Cheflera no Etelvina Carneiro




   Ao percorrer suas margens, vemos uma grande quantidade de canos de esgoto caindo diretamente das casas ribeirinhas. No barranco que escolhi para fazer minha ilustração, por exemplo, compartilhei o espaço com um cano despejando dejeções o tempo todo. A água do regato, translúcida em alguns pontos, não deixa enganar quanto ao desagradável odor.

Barranco selecionado para interferência

      Utilizei como tema alguns dos peixes cada vez mais raros da bacia do Rio das velhas, pintando-os num barranco de argila e areia com tinta biodegradável. Ao ser questionado por alguns transeuntes acerca da escolha de um espaço tão frágil e inconsistente para fazer o trabalho, disse apenas que, tanto o desenho quanto o ribeirão estão fadados a um fim inevitável.

Ilustração no barranco



Pintura em acrílico sobre barranco, por Wederson
  

   Provavelmente, daqui há alguns anos, o que restar do córrego se transformará em mais uma avenida sanitária. Pois o mundo precisa cada vez mais de avenidas,  e menos rios...


segunda-feira, 18 de julho de 2016

Zeus e Hera

   Fiz uma homenagem aos meus pais retratando-os numa alusão ao grande casal mitológico. Obviamente, ao compreender a mitologia, percebe-se que suas personagens possuem caprichos de vaidade, poder, ambição, traições e mesmo crueldade que, graças a Deus, estão longe de equiparar-se à personalidade tão simplória  e generosa de meus pais. Nem eu seria, por esta pretensa ascendência familiar, um deus! Trata-se apenas da apropriação, como dito em publicação anterior, da temática clássica que tanto me encanta, numa fusão quase caricata com motivos contemporâneos. Para tanto, no topo da hierarquia da mitologia clássica greco-romana, este pilar da cultura ocidental, coloco a imagem de meus pais, que não sendo o seres supremos do universo, o são em meu universo subjetivo.




Zeus, ou um retrato paterno- acrílico sobre tela_ 120x200cm
por Wederson

Hera, ou um retrato materno- acrílico sobre tela- 150x180 cm
por Wederson

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Um sagui na lixeira

   Tem sido comum, em alguns recantos de Belo Horizonte, deparar-se com certos animais silvestres. Isso, bem mais que interessante ou belo, é um dado preocupante, pois denota uma situação já tão evidente: a destruição das matas e habitats naturais no entorno da cidade, motivadas em grande parte por uma especulação imobiliária desordenada, e degradação das áreas rurais do estado. Resta a esses animais migrarem para um polo onde, sem opção, possam encontrar um mínimo de recurso para sobrevivência. Uma vez nos grandes centros urbanos. tornam-se vítimas ainda mais vulneráveis,  e entre outros problemas, precisam readaptar-se a novos hábitos, geralmente insalubres.
   Imagine só a que ponto chega o desalento desses animais, tendo que convergir, pela necessidade vital, na direção de uma realidade que, por nossa presença, sempre foi-lhes o pior dos pesadelos! Pintei um mico numa lixeira, e isso, infelizmente, não tem nada de engraçado: é apenas um retrato, triste e perturbador, de uma situação cujo fim não posso prever, mas consigo imaginar...



O MICO_ pintura sobre lixeira, por Wederson

domingo, 10 de julho de 2016

Carta LA MORT

   A carta "A morte", para os mais desavisados, pode parecer assustadora! A icônica imagem de um esqueleto com a foice sempre povoou, em nossa cultura e imaginário, as mais tenebrosas ideias, mas o universo do tarot não faz traduções tão literais: ela indica, em suma, mudanças e transformações, boas ou ruins, sinalizando o fim de períodos ou processos. 
   Minha concepção plástica traz a figura de uma menina, meiga e terna como o são as crianças, simbolizada como o anjo da morte, tão amedrontador quanto sedutor, munida de uma arma devastadora, numa ambígua atitude de afeto e destruição. Sua atitude, entretanto, não é ameaçadora, e antes, ela carrega melancolicamente a arma como quem, forçosamente, vê-se na iminência de passá-la a nossas mãos, cujas ações irresponsáveis leva-nos ao verdadeiro fim.




La Mort_ acrílico sobre tela_ 150x100 cm, por Wederson

sexta-feira, 8 de julho de 2016

O bebê

   A obra de duplicação da avenida Pedro I, em Belo horizonte, acabou deixando a cicatriz de inúmeras casas antes ali existentes, em paredes decrépitas expostas em suas margens. Tal situação tem favorecido a intervenção pictórica de inúmeras pessoas, com iniciativas que vão desde gestos artísticos até mensagens e símbolos de protesto.  O que vem bem a calhar, já que não foi feito um plano paisagístico para o local, e assim esses espaços têm servido como mural lúdico à visualização de milhares de transeuntes que por este corredor passam diariamente.
    Como morador da regional norte, setor que contempla grande parte da referida avenida, deixei também minha contribuição, na forma de uma singela pintura cuja incongruência gritante pretende remeter à vida que, mesmo nos mais obscuros recônditos, insiste brotar.






                          O bebê- pintura em acrílico sobre parede na avenida Pedro I, por Wederson

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Sobre canetas e caixotes

   
   Em 2009, por ocasião da conclusão de minha graduação em artes plásticas, e tendo como uma de minhas especializações o desenho, resolvi fazer um trabalho um pouco diferente. Como eu já me via às voltas com as canetas esferográficas, utilizei-as na confecção de um grande desenho, impresso nas laterias de uma pilha de 40 caixas de verdura. Foram gastas mais ou menos 700 canetas para se alcançar o resultado almejado, e duas semanas de trabalho. Tudo isso, para não parecer demasiadamente excêntrico, sinalizando a finitude das coisas: A finitude da própria obra, que tendo por química a tinta das canetas, cuja composição, após anos de exposição à luz, se apaga; a finitude das plantas, já em sua origem fadadas a se tornarem matéria prima do capital; a finitude da natureza virgem, não o seu fim em si, mas aquele acelerado pelo esfaimado apetite da ambição humana; e por fim, nossa própria e incondicional finitude.
   Tendo sido exposta uma vez, e por não haver na época como preservá-la, a melhor solução foi incinerá-la, corroborando o propósito pelo qual surgiu...





Canetas esferográficas sobre caixotes de fruta, por Wederson



sábado, 2 de julho de 2016

O pescador 2( e seus novos amigos)

   Como é interessante a forma que o ser humano dialoga com seu espaço, suas demandas sociais e sua maneira de ver o mundo! O espaço público, sempre sujeito à ação das pessoas, reconfigura-se todo dia, em reconstruções tanto singulares como coletivas, e é isso que não afoga o mundo numa estagnação mórbida. A arte urbana, como linguagem e instrumento provocador, não pode ser melhor sucedida quando, por iniciativas imprevisíveis, também se reconfigura, assumindo novas dialéticas. 
   E não é que O PESCADOR, tratado anteriormente  em publicação aqui no blog, acabou sendo flagrado em um novo contexto, que por si daria uma convenção de sociologia! Eu não poderia deixar de sentir-me mais satisfeito com um desfecho tão interessante, apropriado e inesperado, sabendo que, a partir de sua infrutífera pescaria, ele resolvera alçar novos vôos, contatos e amizades. Vá, meu amigo desinquieto, pois este mundo imenso e belo, sendo de todos nós, também é seu...

 ( Agradeço a minha grande amiga Dalila Cristina Costa, que fez o belo flagrante fotográfico e o compartilhou comigo).


sexta-feira, 1 de julho de 2016

O ninho

   Quase na entrada de minha garagem há um poste, e nas calçadas de minha rua, antes tão bucólica, não há a presença de uma única árvore! Tenho visto como o concreto, qual lava vulcânica, vai corroendo as cidades, enrijecendo da mesma forma o estado de espírito das pessoas. Fiz esta pintura querendo enganar-me a mim mesmo, mas sei que, no fim, a natureza vencerá o concreto...